Teste Honda XL750 Transalp - Honrar o Passado

A muito esperada Honda Transalp chegou finalmente às nossas mãos. A expectativa era grande, os números prometiam e pudemos finalmente comprovar toda a sua competitividade. Mesmo com um dia cinzento e triste, saímos do Algarve com vontade de a trazer para casa…

andardemoto.pt @ 3-5-2023 13:01:09 - Texto: Pedro Alpiarça

Faça uma consulta e veja caracteristicas detalhadas:

Honda XL750 Transalp | Moto | Adventure

Não há grande coisa que possamos fazer quando São Pedro não colabora. Assim que acordámos e vimos o dilúvio que nos esperava, baixámos a cabeça, ajustámos o nosso equipamento para enfrentar os elementos e pusemos mãos à obra. Dos fracos não reza a história. No meio da copiosa chuva alegrava-nos o facto de estarmos a testar a mais recente versão de um ícone, e se algo o caracterizava era a facilidade de utilização, pois então que venha a intempérie! A máquina ajuda.

Mas comecemos pelo princípio. A apresentação estática tinha decorrido na noite anterior e, tal como é apanágio da marca, todos os engenheiros responsáveis pelo desenvolvimento da nova Transalp encontravam-se disponíveis para responder às nossas questões e esclarecerem as nossas dúvidas. Não eram muitas, mas algumas delas eram bastante prementes. O primeiro impacto visual revelava uma moto compacta, de volumetria controlada, mas sem pudor em demonstrar a sua ligação ao passado. Esta nova Transalp não envergonha a sua ascendência, pelo contrário, refina-a. O depósito de combustível deixou de ser voluptuoso, mas toda a sua fisionomia está mais fluida, mais proporcional, digamos assim. O design do farol dianteiro pisca o olho à família, assim como os comutadores, num claro aproveitamento de recursos e sentimento de pertença à restante gama. Gostaríamos de salientar a correcta proporção de todo o conjunto, esta é uma trail de média cilindrada e o seu propósito encaixa mais no espectro da simpatia ao invés da exuberância. Somos convidados (em vez de desafiados) a experimentá-la.

Chegada a altura de colocarmos as nossas questões, os simpáticos engenheiros japoneses colocaram-se à disposição de nos mostrar a sua visão, e por mais simplista que isto pareça, é um verdadeiro privilégio sorver o conhecimento daqueles que desenham uma máquina de raíz. Fascinante e enriquecedor, no mínimo…

Sob o desígnio de “Touring de aventura”, questionámos o baixo posicionamento do escape associado a uma jante 21”, e a resposta foi peremptória. Distribuição de peso e posicionamento para fazer funcionar o conjunto de malas (escape), e polivalência de utilização em todos os cenários sem perder a eficácia geral (no caso da dimensão da roda dianteira). Quem ouve um japonês falar da sua arte imediatamente percebe que não há aqui um pingo de exuberância latina ou uma hipérbole de atitude associada ao ego, nada disso.

Factos, coerência na exatidão dos mesmos e sobretudo muita humildade e orgulho baseado no trabalho executado. Posto isto, restava-nos comprovar o mote. Uma nova Transalp nascia para o segmento das trail de média cilindrada com um propósito: ser a verdadeira moto de aventura turística, acessível e competente. Desconfiados, fomos dormir com vontade de puxar as orelhas à máquina até ela dizer a verdade…até porque havia muito para testar.


Começando pelo mais óbvio, a partilha do bloco motriz com a nova Hornet. O bicilíndrico paralelo foi desenhado de raiz, com apontamentos tecnológicos que revelam uma aposta tanto na eficácia termodinâmica (caixa de ar com indução por vórtice, ligeiramente maior que na CB 750) como na optimização das dimensões do próprio motor (sistema Unicam derivado da CRF 450, onde apenas uma árvore de cames é utilizada permitindo um posicionamento vertical das válvulas e debelando vibrações). A gestão electrónica foi adaptada para um maior enfoque na entrega a baixas rotações mas os injectores de alto débito (iguais aos da Fireblade) mantêm-se, assim como um revestimento de baixo atrito nas paredes dos cilindros. Toda a transmissão primária (vulgo caixa de velocidades) é igual à da Hornet, sendo que a maior dimensão da jante de 18”, com pneu 150, faz com que a entrega de potência seja ligeiramente menos reactiva.

Posto isto, os números continuam bastante interessantes. Para uma cambota desfasada a 270º, os 755 cc debitam 92 cv às 9500 rpm e o binário mostra uns expressivos 75 Nm às 7250 rpm. Como esperado, na estrada a Transalp mostra-se viva e sempre disposta a agradar. A entrega de potência nos altos regimes é um pouco menos exuberante que na Hornet, mas a maneira como cresce nos primeiros números do conta-rotações afigurou-se uma boa surpresa. À saída das curvas mais lentas, mesmo numa mudança acima, o escape soa rouco e cheio, e ganhamos momento de forma decidida. Este é um óptimo motor, que surpreende pela atitude eloquente do seu discurso, conseguindo dar alma e envolvência à condução.

Como começamos o dia nas piores condições climatéricas, o modo Rain (um dos cinco disponíveis: Sport, Standard, Rain, Gravel e User) foi o escolhido para nos ajudar a “aclimatizar”. Com os níveis de entrega de potência, travão motor e controlo de tracção adaptados a cada um dos mapas, rapidamente mergulhamos no modo User para moldarmos a máquina à nossa medida. O processo é directo e fácil de esquematizar, e segue o princípio de interface dos outros modelos, tudo bem legível no ecrã TFT (com 5” e 4 variações de layout, está preparado para o sistema de controlo por voz da Honda, do qual somo fãs pela forma simples e eficaz do seu funcionamento).

A Serra do Caldeirão mostrava-nos toda a sua excelência, e no meio desta overdose de curvas e contracurvas, demos por nós a elevar o ritmo atrás dos nossos colegas do Benelux. Vindos do Norte da Europa, não são estranhos à falta de atrito e à chuva constante, e a epifania surge quando testamos o grip dos Metzeler Karoo Street num asfalto completamente ensopado. A Transalp é altamente previsível nas suas reações, e sente-se compacta e responsiva aos inputs do condutor. Este conjunto potencia a confiança, de tal modo que a estrada em forma de carrossel estava a ser despachada com muito mais atitude do que o esperado. Informativa e leve, dando-nos a sensação de controlo nas situações mais temerárias, esta ciclística vem de encontro à filosofia vendida pela marca em relação a este modelo, um “manuseamento simpático para uma versatilidade confortável e prática, aliados a uma performance excitante”. Na mouche.


A tal facto, não é alheio o trabalho efectuado na ciclística. As suspensões Showa (forquilha invertida com funções separadas, com 43 mm de diâmetro e 200 mm de curso, revelando 15 níveis de ajuste de pré-carga; e monoamortecedor traseiro com 190 mm de curso, também com ajuste de pré-carga em 5 níveis) foram desenvolvidas para trabalharem em conjunto com o quadro. Este último partilha a sua base com a Hornet, tendo no entanto sido reforçado nos apoios chave (suportes do motor, apoios da suspensão traseira) e recebido um subquadro traseiro de maiores dimensões.

Por sua vez, o braço oscilante em alumínio apresenta um formato semelhante ao da Àfrica Twin.

O resultado define-se como um pisar muito equilibrado, com afinações vocacionadas para um turismo assertivo, em que não existem excessos de ondulações nos apoios mais instáveis ou reações bruscas nos ressaltos inesperados.

Um patamar dinâmico estável e intuitivo, exatamente o que se pretende nas longas tiradas de turismo a que a nova Transalp se propõe.

Ficou em falta um ajuste remoto de pré-carga no amortecedor traseiro, imagem ilustrada pelo batalhão de engenheiros que nos ajudou quando pedimos um ligeiro acerto… nunca estivemos tão perto de nos sentirmos na pele do Marc Marquez.

Desde os primeiros instantes aos seus comandos que a simpatia da ergonomia nos agradou. O assento é acolhedor, confortável e confere boa acessibilidade ao solo (850 mm de altura), e todas as proporções do conjunto servem para agradar, com os 208 Kg de peso em ordem de marcha a facilitam as manobras a baixa velocidade.

A protecção aerodinâmica foi desenhada de forma a que o motociclista se sinta protegido da maior parte da deslocação do ar, sem turbulências de nota para estaturas médias, mesmo não tendo um deflector ajustável.

Quando o Sol abriu e o asfalto secou, o modo Sport tornou-se consensual na caravana e alguns poisa-pés sofreram as consequências do aumento do ritmo. A jante dianteira de 21 polegadas consegue quebrar o seu elevado momento angular com facilidade e, mesmo sob travagens fortes, a sua inserção em curva nunca hesitou ou mostrou preguiça. O sistema de travagem Nissin é muito bem dimensionado (duplo disco dianteiro de 310 mm de diâmetro com pinças radiais de pistão duplo, e disco traseiro de 256 mm), com bom toque e potência evidente, se bem que gostaríamos de um travão traseiro um pouco mais contundente na sua acção.


Quem põe esta simpática trail em pontas dos pés é o irrequieto motor, mais uma vez um verdadeiro folião à espreita da melhor altura para se exibir.

E o fora de estrada? Pois que, infelizmente, o track escolhido estava absolutamente impraticável, demasiado escorregadio para oferecer as mínimas condições de segurança ao grupo. A lama venceu a resiliência nipónica e nós tivemos de aceitar que o improviso e o típico “deixa-lá-ver-se-corre-bem” latinos nem sempre podem entrar na equação.

Por isso aqui fica a nossa promessa de um teste dedicado ao turismo de aventura, exclusivo para esta nova Transalp (talvez atravessar o país de uma ponta a outra por caminhos menos batidos…). Até porque a posição de condução em pé pareceu-nos bastante eficaz, a distância ao solo (210 mm) é bastante aceitável, e o arsenal electrónico tem as especificações requeridas para o efeito. O modo Gravel tem um setting específico de ABS Off-Road, facilitando um ligeiro bloqueio inicial da roda traseira (podendo mesmo ser totalmente desligado na sua acção sobre a mesma).

Nesta apresentação pudemos ver ao vivo alguns dos acessórios que equipavam as motos disponíveis para teste, e gostaríamos de enaltecer o intocável funcionamento do quick-shifter (um acessório fundamental para enfrentar as incontáveis curvas do Caldeirão), do aspecto robusto da protecção de cárter e das crash-bars com faróis auxiliares, e até mesmo dos pequenos defletores de vento que nos ajudaram a desviar as diluvianas quantidades de água que nos atingiam em deslocamento.

Estes acessórios serão apenas uma amostra do vasto catálogo proposto, sendo que a marca agregaos em cinco categorias: Urban, Adventure, Rally, Confort e Touring, onde encontrarão as combinações ideais para o vosso gosto ou propósito (desde malas laterais, Top-case, poisa-pés off-road, vidro deflector maior, descanso central, protecções de punhos, punhos aquecidos, etc).


A nova Transalp honra a moto que nasceu em 1986 para tocar toda uma geração de viajantes de aventura. Não só o faz com brio e classe, como encaixa todo o seu poder argumentativo numa premissa de facilidade de utilização.

Se o segmento das trail de aventura de média cilindrada grita aventura e desafio, poucos serão aqueles que levam o conceito à letra. Por mais que gostemos de ver um Pol Tarrés a fazer malabarismos, existe uma fatia grande de compradores que não tem qualquer interesse em explorar esse lado mais extremo.

Por 10.600 € (um valor abaixo das rivais), a nova Transalp surge certeira na atitude e muito competente no propósito. Arriscamos mesmo dizer que, com a mesma relação peso/potência da poderosa Africa Twin, muitos sentir-se-ão mais à vontade neste envelope mais acessível, mas carregado de bons argumentos. E então, quando rodarem o punho direito, ainda mais felizes ficarão com a sua escolha. 

Faça uma consulta e veja caracteristicas detalhadas:

Honda XL750 Transalp | Moto | Adventure

andardemoto.pt @ 3-5-2023 13:01:09 - Texto: Pedro Alpiarça


Clique aqui para ver mais sobre: Test drives